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    esforços que eu tenha feito para os trazer a certa harmonia. Agostinho não me ajuda; tem
    outros cuidados. Eu mesma já não me sinto com forças, e então pensei que um amigo, um
    homem moderado, um homem de sociedade, hábil, fino, cauteloso, inteligente, instruído...
     Eu, em suma?
     Adivinhou.
     Não adivinhei; é o meu retrato em pessoa. Mas então que lhe parece que possa fazer?
    Pode corrigi-los por boas maneiras; fazê-los unidos, ainda quando discordem, e que
    discordem pouco ou nada. Não imagina; parece até propósito. Não discordam da cor da Lua,
    por exemplo, mas aos onze anos Pedro descobriu que as sombras da Lua eram nuvens, e
    Paulo que eram falhas da nossa vista, e atracaram-se; eu é que os separei. Imagine em
    política...
     Imagine em amores, diga logo; mas não é propriamente para esse caso...
     Oh! não!
     Para os outros é igualmente inútil, mas eu nasci para servir, ainda inutilmente.
    Baronesa, o seu pedido equivale a nomear-me aio ou preceptor... Não faça gestos; não me dou
    por diminuído Contanto que me pague os ordenados... E não se assuste; peço pouco, pague-
    me em palavras; as suas palavras são de ouro. Já lhe disse que toda a minha ação é inútil.
     Por quê?
     É! inútil.
     Uma pessoa de autoridade, como o senhor, pode muito, contanto que os ame, porque
    eles são bons, creia. Conhece-os bem?
     Pouco.
     Conheça-os mais e verá.
    Aires concordou rindo. Para Natividade valia por uma tentativa nova. Confiava na ação do
    conselheiro, e para dizer tudo... Não sei se diga... Digo. Natividade contava com a antiga
    inclinação do velho diplomata. As cãs não lhe tirariam o desejo de a servir. Não sei quem me
    lê nesta ocasião. Se é homem, talvez não entenda logo, mas se é mulher creio que entenderá.
    Se ninguém entender paciência; basta saber que ele prometeu o que ela quis, e também
    prometeu calar-se; foi a condição que a outra lhe pos. Tudo isso polido, sincero e incrédulo.
    CAPÍTULO XXXIX / UM GATUNO
    Chegaram ao Largo da Carioca, apearam-se e despediram-se; ela entrou pela Rua Gonçalves
    Dias, ele enfiou pela da Carioca. No meio desta, Aires encontrou um magote de gente parada,
    logo depois andando em direção ao largo. Aires quis arrepiar caminho, não de medo, mas de
    horror. Tinha horror à multidão. Viu que a gente era pouca, cinqüenta ou sessenta pessoas, e
    ouviu que bradava contra a prisão de um homem. Entrou num corredor, à espera que o magote
    passasse. Duas praças de polícia traziam o preso pelo braço. De quando em quando, este
    resistia, e então era preciso arrastá-lo ou forçá-lo por outro método. Tratava-se, ao que parece,
    do furto de uma carteira.
     Não furtei nada!  bradava o preso detendo o passo. É falso! Larguem-me! sou um
    cidadão livre! Protesto! protesto!
     Siga para a estação!
     Não sigo!
     Não siga! bradava a gente anônima. Não siga! não siga!
    Uma das praças quis convencer a multidão que era verdade, que o sujeito furtara uma carteira,
    e o desassossego pareceu minorar um pouco; mas, indo a praça a andar com a outra e o preso,
     cada uma pegando-lhe um dos braços, a multidão recomeçou a bradar contra a violência. O
    preso sentiu-se animado, e ora lastimoso, ora agressivo, convidava a defesa. Foi então que a
    outra praça desembainhou a espada para fazer um claro. A gente voou, não airosamente, como
    a andorinha ou a pomba, em busca do ninho ou do alimento, voou de atropelo, pula aqui, pula
    ali, pula acolá, para todos os lados. A espada entrou na bainha, e o preso seguiu com as
    praças. Mas logo os peitos tomaram vingança das pernas, e um clamor ingente, largo,
    desafrontando, encheu a rua e a alma do preso. A multidão fez-se outra vez compacta e
    caminhou para a estação policial. Aires seguiu caminho.
    A vozeira morreu pouco a pouco, e Aires entrou na Secretaria do Império. Não achou o
    ministro, parece, ou a conferência foi curta. Certo é que, saindo à praça, encontrou partes do
    magoté que tornavam comentando a prisão e o ladrão. Não diziam ladrão, mas gatuno, fiando
    que era mais doce, e tanto bradavam há pouco contra a ação das praças, como riam agora das
    lástimas do preso.
     Ora o sujeito!
    Mas então... perguntarás tu. Aires não perguntou nada. Ao cabo, havia um fundo de justiça
    naquela manifestação dupla e contraditória; foi o que ele pensou. Depois, imaginou que a
    grita da multidão protestante era filha de um velho instinto de resistência à autoridade.
    Advertiu que o homem, uma vez criado, desobedeceu logo ao Criador, que aliás lhe dera um
    paraíso para viver; mas não há paraíso que valha o gosto da oposição. Que o homem se
    acostume às leis, vá; que incline o colo à força e ao bel-prazer, vá também; é o que se dá com
    a planta, quando sopra o vento. Mas que abençoe a força e cumpra as leis sempre, sempre,
    sempre, é violar a liberdade primitiva, a liberdade do velho Adão. Ia assim cogitando o
    conselheiro Aires.
    Não lhe atribuam todas essas idéias. Pensava assim, como se falasse alto, à mesa ou na sala de
    alguém. Era um processo de crítica mansa e delicada, tão convencida em aparência, que
    algum ouvinte, à cata de idéias, acabava por lhe apanhar uma ou duas... ia a descer pela Rua
    Sete de Setembro, quando a lembrança da vozeria trouxe a de outra, maior e mais remota.
    CAPÍTULO XL / RECUERDOS
    Essa outra vozeria maior e mais remota não caberia aqui, se não fosse a necessidade de
    explicar o gesto repentino com que Aires parou na calçada. Parou, tornou a si e continuou a
    andar com os olhos no chão e a alma em Cartacas. Foi em Caracas, onde ele servira na
    qualidade de adido de legação. Estava em casa, de palestra com uma atriz da moda, pessoa [ Pobierz caÅ‚ość w formacie PDF ]

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